Organização de direitos humanos está entre imóveis listados para alienação pelo governo do RJ
O Grupo Tortura Nunca Mais (GTNM-RJ), entidade histórica de defesa dos direitos humanos e da memória das vítimas da ditadura militar, corre o risco de perder sua sede, localizada em Botafogo, zona sul do Rio. O imóvel foi incluído em uma lista enviada pelo governo do estado à Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), que prevê a possível alienação de bens públicos atualmente ocupados por entidades da sociedade civil.
A medida preocupa movimentos sociais e organizações sem fins lucrativos, que há décadas utilizam imóveis públicos desocupados para desenvolver atividades reconhecidas de interesse público. No caso do GTNM-RJ, a ocupação da sede foi formalizada em 1994, por meio de cessão do Estado. Desde então, o espaço na Rua General Polidoro abriga ações voltadas à acolhida de vítimas de violência, preservação da memória histórica e promoção da cidadania.
A possível alienação foi criticada em nota publicada pela entidade. “A inclusão do imóvel na lista põe em risco a continuidade das atividades de uma organização que não tem fins lucrativos, não recebe financiamento do Estado e depende exclusivamente da solidariedade da sociedade civil”, afirma o comunicado.
A reação à proposta mobilizou mais de 800 assinaturas em um abaixo-assinado que pede a retirada do imóvel da lista de alienações. O documento defende que os casos de organizações sociais sejam analisados individualmente, a fim de preservar as funções públicas que exercem.
Alienação de imóveis públicos gera debate
A proposta do governo do estado ainda está em fase de tramitação na Alerj. Em reunião realizada na quarta-feira (3), o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), deputado Rodrigo Amorim (União), designou o deputado Alexandre Knoploch (PL) para coordenar um grupo de trabalho sobre o tema. Segundo Amorim, vistorias serão realizadas nos imóveis listados, e um relatório preliminar deve ser apresentado nos próximos dias.
“Todos os pedidos de exclusão ou inclusão de imóveis estão sendo analisados durante a tramitação do projeto”, disse o parlamentar.
Além da sede do GTNM-RJ, a lista inclui imóveis emblemáticos como o Estádio Caio Martins (Niterói), o Batalhão da PM do Leblon, a sede do Grupo Arco-Íris (movimento LGBTQIA+) e a Escola de Música Villa-Lobos.
Em nota, a Casa Civil do governo estadual afirmou que o projeto tem “caráter autorizativo” e que, mesmo com a aprovação, caberá ao governo decidir sobre a eventual alienação. O texto também destaca que será dada “atenção especial a instituições que prestam serviços de relevante interesse social”.
Risco à memória e à cidadania
Para críticos da proposta, a alienação de imóveis públicos usados por organizações sociais representa não apenas a perda de espaços físicos, mas também o enfraquecimento de políticas de memória, cidadania e direitos humanos em um momento de retrocessos democráticos. O Grupo Tortura Nunca Mais, fundado em 1985, é reconhecido nacional e internacionalmente por sua atuação na luta contra a tortura e pela responsabilização de agentes da repressão.
A possível retirada da sede histórica da entidade é vista por apoiadores como um ataque simbólico à preservação da memória do período ditatorial e ao compromisso com os direitos humanos no Brasil.